quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Sobre o amor lascivo.



Um hotel ordinário. Duas pessoas que se encontram e que fazem o resto do mundo ruir de inveja, silêncio e tédio. Eternidades e almas sendo jogadas – julgadas nunca: julgamentos não cabem quando se tem essa vontade.
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terça-feira, 29 de janeiro de 2008

Para você.


Escuta aqui, sua escrota que dorme comigo todas as noites, olha, nenhuma das vezes que você abraçou o travesseiro achando que estava me abraçando eu estava lá. Estou sendo sincera, não tinha ninguém alí, você estava s-o-z-i-n-h-a. Você precisa aprender a parar de se refugiar em mim.
Mas eu queria também te dizer, que apesar de você às vezes se sentir muito sozinha, que nós somos milhares, porra, você sabe. E sabe também que todas nós te achamos a mulher mais foda desse mundo.
Queria aplaudir por todas as vezes que você poderia ter mandado alguém tomar bem no meio do cu sujo dele e foi lá e mandou.
Queria aplaudir por todas as vezes que você se fez menina para que ficar mulher fosse ainda maior e melhor.
Obrigada por sempre ter me chamado, mesmo quando eu não te dei ouvidos, obrigada por sempre ter deixado o caminho fácil para te encontrar.
Acredite que agora comigo, conquistar o mundo vai ser fichinha.
Ah, e ainda tem mais uma coisa: Sua bunda até que é gostosinha, mas o todo o resto é um escândalo!!!

Não, eu não sou maluca, é que aqui dentro tem várias de mim e uma delas cansou de me detonar.

segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

Sobre o sonho.



- Eu te pedi que não viesse atrás de mim.
- Eu sei.
- É, mas eu viria aqui por você também.
- Case comigo.
- Você já é casado.
- Eu não estou usando aliança.
- Mas eu enxergo a corda no seu pescoço.
- Foge comigo.
- Você não tem coragem.
- Café para o senhor e sua esposa?
- Não, ela não é a minha esposa, ela é a minha mulher.
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(Porque eu sonhei com este diálogo a noite inteira)
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sábado, 26 de janeiro de 2008

Des[encontro]


Havia nuvens. Elas eram os carteiros dos amores impossíveis e mandavam em sopro, aquilo que as árvores guardaram em segredo. O que aquela árvore viu, foi o que eles não se permitiram. Mas sobrou uma inscrição no caule, uma esperança dentro dos dois e o medo de que o tempo destruísse tudo.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Sobre amor[te]

(Imagem do espetáculo "La Petite Mort". Coreografia do gigante Jiri Kylián. Música de Mozart)


Não nos provoca riso o amor quando chega ao mais profundo de sua viagem, ao mais alto de seu vôo: no mais profundo, no mais alto, nos arranca gemidos e suspiros, vozes de dor, embora seja dor jubilosa, e pensando bem não há nada de estranho nisso, porque nascer é uma alegria que dói.
Pequena morte, chamam na França a culminação do abraço, que ao quebrar-nos faz por juntar-nos, e perdendo-nos faz por nos encontrar e acabando conosco nos principia. Pequena morte, dizem; mas grande, muito grande haverá de ser, se ao nos matar nos nasce. (Eduardo Galeano)

Porque este eu tinha que roubar pra mim.

Vale conferir - Link do final do espetáculo: http://br.youtube.com/watch?v=RtiFyy4VEhM

terça-feira, 22 de janeiro de 2008

Sobre as verdades.


O Cicrano me ensinou a ser paciente.
Beltrano me ensinou a ser romântica.
Fulaninho me ensinou a ser fiel.
Coisinha me ensinou a acreditar em príncipe encantado.
E você, Gabriel Hernandez, me ensinou a desacreditar nisto tudo.

segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Milágrimas


A cada mil lágrimas me sai um milagre.
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(Por que hoje eu resolvi substituir o destino pela probabilidade.)




sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

Sobre a assas[sina]




Era conhecer um cara interessante, que Bárbara logo soltava um de seus tiros certeiros a fim de testar a sua mira, só não sei se mirava a própria cabeça ou a do sujeito.
Ela tinha um lema: Se eu der o tiro mais certeiro, só O Grande sobreviverá, e aí sim, ele será digno de uma segunda vida.
O que ela não sabia, é que nem todo mundo vai a um encontro usando coletes à prova de balas.
Então todo mundo acabava baleado, ela sempre acertava a mira do outro. Só não sei se isso a alegrava ou entristecia, pois ela sempre acordava sozinha.
Inicialmente Bárbara tinha três tipos de balas preferidas, uma era mandar um sms “porque você sumiu?”. Bang, primeiro tiro. Se ele ainda sobreviver, tinha o e-mail: “estou com saudades” Bang-bang, segundo tiro. E não obstante, tinha A grande bala, o telefonema:
“Vamos almoçar na casa dos meus pais domingo?”

Bang-bang-bang. Xeque-mate. Aur revouir. Hasta la vista, baby.

E ela não estava com saudades porra nenhuma, Bárbara nunca sentia falta de ninguém. Ela estava pouco se fodendo para esses babacas medrosos, ela não tolerava homem frouxo e testava sua covardia.
Bárbara fazia isso pelo mórbido prazer de vê-los com o cu na mão. Era assim que ela se vingava dos homens.
Tudo começou com um casinho, já fazia 3 dias que o sujeito estava na casa dela obrigando-a a cheirar o peido dele, a catar a roupa dele no chão e tolerar os barulhinhos irritantes dos jogos de porrada do seu ps2, mas saiu pra nunca mais voltar quando Bárbara disse: -Ei, eu gosto de você.

Então ela virou uma fuzileira: "posso te ver?", “posso passar no teu trabalho?”, “vamos ao cinema?”, “estou com saudades”, “o que você vai fazer na semana santa?”.

Bang-bang-bang-bang-bang.
Eram todos certeiros, e na testa do sujeito.
Na cabecinha dos homens, as mulheres viam a vida como um jogo de playstation, fase 1: vamos fuder. Fase 2: casar, ter trigêmios no dia do jogo do mengão e comprar um labrador. E isso emputecia Bárbara, porque ele podia comê-la, mas jamais passear de mãos dadas num fim de tarde. Ela não queria casar com nenhum deles, só queria ser agradável.

A coisa ficou tão pesada, e Bárbara cada vez mais vil, que um simples “você é bacana” deixava o sujeito em coma, ela se sentia então a própria pica de Deus.

Aquilo subiu a cabeça, o sonho de ter apenas um cara legal para “dividir uma pizza e trepar de vez em quando”, foi dissipado. Por isso que ela agora só jogava pesado, e sujo. Hoje ela trepa e diz “ quero um filho teu”, “vamos nos casar amanhã em Las vegas?” , “Posso dormir com vc?”
E então ela conheceu o Pedro, um homem que não só sobreviveu a todos os seus tiros, como conseguiu ver Bárbara como ela era exatamente: uma menina que morria de medo do amor, e usava as armas que tinha pra se defender.
E nesse extermínio de pretendentes, Bárbara o encontrou. Encontrou aquele cara que chupou todas as suas balas e embalou para presente todos os seus medos.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

Sobre o não amor.


Eles se conheceram ao acaso, tinham inimigos em comum (Elvis, Roberto Carlos e Gabriel Garcia Marquez).
Ela, moderninha, descolada e neurótica.
Ele, certinho, almofadinha, olhar certeiro e ar blasé.

Conversaram cada qual com sua armadura e mantiveram distância, até que um topou com a mão do outro e após umas biritas o beijo foi inevitável.

Mas combinaram que aquilo não seria amor. Poderiam dividir a cerveja, trocar discos e livros mas aquilo não seria amor. Estavam alí só porque suas vidas eram entediantes e ter uma trepada amiga e segura deixava o próximo dia mais suportável.

Sempre tinha uma expectativa bacana quando iam se encontrar pra tal trepada amiga, era como se ela andasse e dissesse para cada pessoa que cruzasse no caminho que enquanto eles iam para suas casas medíocres encontrar com seus cônjuges mal-humorados e desarrumados, ela ia trepar. Ela ia trepar a noite inteira. E que ela é sempre assim, maquiada, cheirosa, bem-humarada, tem hálito de halls preto o dia todo, tem cintura fina e bunda dura.

Naqueles dias em que iam se encontrar e trepar, ela não lembrava que estavam juntos apenas por medo de seguir em frente, e que estavam um perante o outro somente pela falta do que fazer.

Não, quando ela estava maquiada e cheirosa, ela era a mulher mais amada do mundo.
Mas depois que eles trepavam e ele não a colocava debaixo do braço, alí na altura do peito, ela se tocava que estava vestida num longo não amor.

E ia pra casa sem ver tantas cores nas ruas, sem vontade de desdenhar dos vizinhos porque trepou, largava as chaves do carro na mesa, deixava que o gato lhe roçasse o rabo nas pernas e ficava deprimida porque sabia que ele ia morrer. Ligou a tv e aquilo a deprimiu também. Foi ler e ficou ainda mais deprimida, porfim resolveu dormir, para enfim sonhar, pelo menos no sono ela não ficava triste, pois em sonho ela podia pular na cintura dele no meio da rua e inventar apelidos cafonas enquanto ele a segurava e dizia: você é minha.

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

Sobre os segredos.


Se conheceram nas aulas de natação. O cabelo loiro até o pescoço, a tatuagem hindu no ombro esquerdo e o olhar certeiro fascinaram.
A atração começou numa carona, que resultou num beijo e que terminou no quarto.
Havia o cheiro suave e irresistível que só um ser daquela estirpe poderia exalar e que inebriava a alma, cheiro úmido de fêmea, aquele líquido sempre escorrendo pelas coxas, a língua macia e o toque vulgar, viraram visitas constantes. Se encontravam às quartas e sextas e sempre se despediam com um recado escrito a batom no espelho: “Minha menina, minha alma, minha vida” e todas essas coisas cafonas que se escrevem quando estão se apaixonando.

Se permitiam tudo, ou melhor, quase tudo, pois havia uma regra: unhas sempre aparadas. Pois as duas não saberiam o que dizer para os namorados se aparecessem marcadas.

segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

O ciúme.




ATO I

Quando me divorciei do meu primeiro marido, pensei que a vida também havia terminado. Ele disse que não me amava mais como mulher, na realidade acho que nunca amou, e num café da manhã me pediu a separação, no mesmo tom de voz que me pedia para lhe passar o leite.
Perguntei logo se ele tinha outra, descobri da sua boca e de alguns contatos que não. Então porque aquilo? Ele, playboyzinho mimado e filho de pais divorciados tinha ótima condição financeira antes de casarmos e não suportou nossa vida simples e cheia de esforços. Voltou a morar com a mãe um ano depois de nossa vida conjugal. Se o motivo foi financeiro, Fábio tomou uma atitude precipitada, pois logo consegui um grande emprego num hospital psiquiátrico e me destaquei com minha clínica, onde finalmente puder ser a psicóloga que sempre sonhei ser um dia, com um salário que fazia jus à minha competência.
A separação foi difícil, só Deus sabe o que sofri. Amargurada e desesperada encontrei na bebida um consolo, na maconha um colo amigo. Com isso veio a carência, e lá se foram outras noites atrás de velhos amigos cujos corpos esculturais não combinavam com as mentes sujas e conversas vazias. Me sentia uma merda transando com os primos das minhas amigas, alguns esperando fazer o marketing com a psicanalista conhecida na sociedade, outros procurando um amor, coitados. Comecei a dar aula numa universidade. Os meninos de lá eram mais liberais e dispostos a tudo para alimentar o meu ego. Era isso que eu precisava, longas massagens no meu ego. Como era fácil levar esses alunos pra um motel, bastava uma conversa intelectual, pagar algumas bebidas, fumar um baseado antes e uma carreira depois. Daí as vezes alguns queriam conversar a noite toda, e eu só queria dormir. Me sentia culpada, o fantasma de Fábio não me largava e resolvi então começar a buscar o prazer com homens e mulheres as quais só o corpo me atraia.

Passei a pagar prostitutas, não ia pegar aluna e ficar com fama de sapatão. Psicólogo já sofre com fama de porra louca, daí ficar com fama de sapatão e maconheira, tava fodida. O ato sexual era frio e satisfatório dentro de sua própria intenção, a fêmea sobre a fêmea, sem dominação, mas após o gozo uma depressão me tomava, às vezes mandava a puta ir embora e me encolhia aos prantos. A falta de um amor verdadeiro me transformava num ser infantil e carente. Fábio me fazia cada vez mais falta. Às vezes ia na frente da sua casa e o fitava escondida. Ele havia batido o carro e torrava a grana que eu agora tinha que pagar de pensão pra ele com uma loirinha gostosinha. Minha decadência era evidente tanto física quanto emocionalmente e o trabalho era a única coisa que me restava.

Eis que um dia, acidentalmente encontrei aquele homem, não foi sua beleza que me impressionou, mas seu caráter e seu jeito simples de ser maravilhoso. João trabalhava com Fábio, nos vimos poucas vezes apesar de eu conhecê-lo bem, pois meu ex-marido falava muito do amigo e de sua separação que se deu bem antes da nossa. O caso do João era diferente, formado em medicina casou-se com uma artista plástica enquanto fazia residência. João desistiu da medicina e fugiu com a artista, viveram bem por dois anos. Ela sempre acompanhava o marido em todas as farras, mas a grana acabou e ele teve que voltar a trabalhar, arrumou um emprego na área de administração porque odiava medicina e conheceu Fábio.
Fábio casou comigo e logo depois João se separou.

Saí algumas vezes com o João, e onze meses depois do início do namoro, casamos. Vivemos uma vida maravilhosa, nunca discutíamos e essa estabilidade emocional foi um trampolim que me proporcionou vôos muito mais altos. Era enfim, o fim das noitadas inúteis, de comer alunos e alunas. João me fazia sentir a mulher mais feliz do mundo apesar do seu temperamento difícil, mas eu estudei oito anos psicologia e psicanálise para lidar também com isto.
Fizemos incontáveis viagens, cada vez uma nova lua de mel. João tinha o dom de parecer um anjo protetor e satisfazer todas as minhas vontades.
Mas tudo mudou numa crise no emprego dele. Eu, apesar da minha fidelidade declarada era uma moça falante e agradavel com as pessoas, sobretudo meus alunos e isso o deixava muito inseguro quanto as minhas reais intenções já que ele soube das minhas histórias do passado.
Nesse dia eu estava lendo “Operação cavalo de Tróia”, de J.J. Benítez, quando percebi em alguns trechos a semelhança desta obra com “O enviado” do mesmo autor. Fui consultar o exemplar de minha humilde biblioteca para fazer a comparação e eis que surpreendentemente havia uma lacuna no espaço anteriormente ocupado pelo livro. Fui imediatamente ao quarto onde João estava só de cuecas e deitado na cama lendo “O pequeno príncipe”, perguntei:

- Você viu O Enviado?

Ele me olhou por cima dos livros, sem movimentar qualquer outra parte do corpo com exceção do globo ocular. Não respondeu. Perguntei novamente. Sua face enrubesceu e respondeu em tom quase imperceptível:

- Joguei fora.
- Jogou fora? - Inquiri quase como eco.
- É, joguei fora.
- Jogou fora? – A idéia finalmente fazia sentido – Jogou fora? Jogou fora? - A ira me tomou o dom da palavra e esbravejando continuei: - Jogou fora, porra! Porque? Vc tá maluco?
- Joguei fora e pronto.
- Que absurdo, eu não acredito !
- O que é que tem?
- Não se joga um livro assim sem mais nem menos e não é a porra de um livro, é o meu livro, caralho! Meu livro.
- Amôr... – Era nossa primeira briga. Não queria desequilibrar uma relação qie sempre se baseou no equilibrio. Respirei fundo, contei até dez e recomecei quase como se fosse minha culpa:
- Por que você fez isso?
- Foi por bobagem – ele enfim saia da sua posição de inércia e deixando a cama e o príncipe de lado partiu pra me abraçar. Deixei meu ombro para suas lágrimas e ele me apertava como se fosse me partir. Recomeçou: - ... foi ciúmes.
- Ciúmes de um livro?
- Não.
- Do que então?

Continuamos abraçados em silêncio. Era sempre assim quando ele não queria falar, eu o abraçava e ficávamos em silêncio por algum tempo até que ele reunisse as palavras e a coragem fosse suficientes para contar.

- Eu queria ler aquele livro... li a contra capa e... – parou. Mais silêncio, mais abraço. - ... quando abri o livro, nas páginas iniciais eu vi... – mais uma pausa, desta vez com raiva nos olhos... – Vi a dedicatória que o Fábio te escreveu.
- E daí meu amor, isso não é motivo pra fazer o que vc fez... O que passou, passou.
- Mas eu senti raiva, saber que você foi dele, que foram felizes...
- Você sabe que por mais que tenha sifo feliz com o Fábio, estou sendo muito mais com você.
- Não sei se isso é verdade e nunca vou saber.
- Que idiotice é essa agora? Se eu gostasse dele, ainda estaríamos casados.
- Foi ele quem te largou Diana, não você.
- É... – tentei contornar a situação. – Mas passado é passado. Ter ciúmes dele é ridículo. Eu te amo e isso é que importa. Vamos procurar na lixeira, talvez o livro ainda esteja lá.

Ele continuou em silêncio e eu argumentei:

- Entenda, é só um livro.
- Não te faz lembrar do passado?
- Faz. Mas entenda que eu sou hoje resultado desse passado, sou o que sou pelas experiências que tive, construi os meus erros, não posso apága-lo, entende?
- Entendo, mas não aceito.

Nos beijamos e recobramos a habitual paz.

- Vamos ver se encontramos o livro? Falei em tom amistoso.
- Impossível.
- Por que? Eu já te disse que não tem nada a ver.
- O problema é que eu queimei o livro.

Depois do choque, comecei a rir do ridículo da situação. João também riu. Na semana seguinte ele me deu outro exemplar com a dedicatória do mesmo livro anterior, só que com a sua assinatura. JOÃO. Em maiúsculo.

ATO II

Dois meses depois eu soube da morte do meu ex-marido. Fábio havia sofrido um acidente automobilístico, exímio motorista e aquele acidente ficou na minha cabeça. Fiquei deprimida pois, por mais que ele não representasse mais nada pra mim, tivemos uma vida juntos e ver um jovem abandonar assim a matéria nos mostra o quanto somos pequenos diante dos mistérios da vida. João, ex-amigo e ex-confidente do meu ex-marido pareceu não se abalar. Quando eu tocava no assunto ele respondia: - Por que chorar? O que passou, passou.

Uma nova crise de ciúmes se apossou de João quando em sonho falei o nome do Fábio. Ele acordou me empurrando, fazendo eu me esquecer do sonho. João gritava como louco: - Nosso caminho agora está livre! E me sacudia desesperadamente. Eu ainda em processo de adaptação ao mundo pude entender o que ele queria dizer, mas aquelas palavras ecoaram em meus pensamentos durante semanas. Tomei coragem num domingo de manhã e perguntei:

- O que você quis dizer com aquilo?
- O quê?
- “Nosso caminho agora está livre!”
- Eu te amo... – ele disse e baixou os olhos. Abandonei minha posição de espectador e o abracei forte, ele então desmoronou, começou a chorar e a dizer que me ama.
- Você... – perguntei algo que formulava em meus pensamentos - ... tem alguma culpa no acidente do Fábio?
- Não fale mais esse nome na nossa casa. Disse apontando o dedo indicador rijo pra mim. Chorou e eu entendi a sua culpa. Nos abraçamos e assim ficamos todo o domingo. Quando resolveu falar, disse que havia desregulado o freio do carro de Fábio após achar umas fotos antigas numa caixa.

Decidimos que o melhor a fazer, seria mais uma lua de mel. Ninguém merecia saber o acontecido. O ciúme do Fábio não tinha mais razão de voltar e eu merecia uma outra chance de ser feliz.

ATO III

Nossa viagem, que deveria ser como todas as outras, teve no seu desfecho, um ato trágico. Dias depois que chegamos em casa percebi que em meu guarda-roupa só havia peças novas e que todas as outras que vinham do casamento anterior tinham desaparecido. Como de praxe após a cena de choro e raiva do João, ele me confessou que havia queimado todas as roupas velhas.
Isso me trouxe alívio, pois finalmente não existia mais nada do meu tempo com o Fábio e o João agora sim iria relaxar. Me enganei.
De repente, o interesse do João em voltar a exercer a medicina me causou espanto, mas logo foi motivo de orgulho, ele estava vivendo de novo. Passava noites e mais noites estudando sozinho lendo, re-lendo e fazendo anotações. Provavelmente iria retomar a residência.
Se era ou não invenção do destino, é dificil dizer, mas a verdade é que cheguei em casa numa quarta-feira com a notícia de que uma van carregando oito noviças havia capotado num barranco perto de nossa casa. Trouxe a notícia e ví João se despedir de mim e ganhar as ruas apressado. Ele voltou depois de duas horas enquanto eu tentava pela enésima vez ler A divina comédia.
João trazia uma caixa de isopor como quem segurava um feto.
- O que é isso? - perguntei.

Ele me sorriu de um jeito malicioso como fazia quando encontrava algum brinquedo para nossas noites. Ele esquentou a janta e me serviu na sala, onde eu e Dante nos reuníamos. A última coisa que me lembro é de beber um suco de laranja enquanto meu marido enfim, sorria pra mim.

Quando despertei em minha cama, 3 dias depois, fiz o que normalmente fazia. Beijei a boca do meu marido, que mesmo domindo ainda exibia um sorriso pleno. Só entendi quando fui tomar banho minutos depois de acordada. João havia decepado a minha boceta, queimado e jogado fora, como fez com meu livro, minhas roupas e meu ex-marido. Arrancou-me as auréolas dos seios e colocou bicos róseos na minha pele morena. Aquilo era a única coisa que me restava e que havia pertencido também ao falecido, mas sabendo a falta que o próprio iria sentir, João implantou em mim as auréolas e a boceta virgem de alguma noviça morta no acidente.
E enfim, vivemos felizes para sempre.

domingo, 13 de janeiro de 2008

Encontro de Escrit[d]ores II

Almoço de domingo



E no sábado de sol pungente fomos dar continuidade a este encontro que ficará guardado com todo o carinho do mundo na minha memória pro resto dos meus dias. Chegamos pra comer a tal moqueca para hipertenso preparada pelo chef Guga que muito me lembrou um gosto de infância, uma moqueca que comi e me deliciei há alguns anos no Paraíso Tropical, alí no Rio Vermelho, ou será que era feita pelo próprio Guga quando trabalhou lá e eu era ainda um projetinho de alguma coisa que ainda não me tornei? Vai saber. Foi minha ligação direta a infância, o que já me deixou nostálgica.
Além dos papos, eu abusando de todos os escritores com minhas perguntinhas de aspirante, passei um pedaço da tarde mergulhada num livro da Clarice na estante do Lupeu, o que me deixou toda dolorida, Clarice tem esse efeito imediato em mim.

Conversas, bebidas, risos, palavrões, cachotas, MÚSICA, POESIA, cigarros, tudo isso brindou o meu final de semana explendoroso.

Acordo neste domingo com ressaca de sono, de novo com gosto de cabo de guarda-chuva na boca, as pernas cansadas, a voz rouca, o sorriso escorrendo no canto da boca e já consegui vender 6 livros dos meninos pra duas pessoas, exijo meus royalties.





Mesmo enjoada e sem fome, fui almoçar. E comi o livro do Gustavo, todo, inteiro, de uma vez, na realidade, mais de uma vez, porque reli algumas coisas, ele disse brincando que o livro dele é o único que não consegue ficar em pé de tão fino, talvez seja daqueles livros feitos para flutuar, pensei.



E fico hoje aqui, saudosa, lembrando de TUDO, e me perguntando se aquilo foi um sonho. Pela enésima vez, muito obrigada a todos.

sábado, 12 de janeiro de 2008

Encontro de Escrit[d]ores

Eu tomando vinho de graça e cheia de graça assinando no livro de comentários destes grandes.


Sempre defendi veemente a teoria de que o youtube é melhor que sexo. E olhe que eu GOSTO de sexo. Quer assistir Jacques Brel interpretando a sua célebre Ne me quite pas? Lá tem. Quer assistir Tom e João Gilberto cantando juntos? Lá tem também. É gozo de graça e com graça.
Mas meus caros, nada substituiu a noite que tive ontem.
Sai com quatro homens.
Tive inenarráveis orgasmos, melhor que o youtube.
Finalmente a minha fantasia mais erótica realizada: a noite de autógrafo destes titãs, e eu lá, sementinha, vendo esses grandes, já colhendo frutos.
Entrei na livraria nada tímida e já procurando aquela figura ímpar, de cabelos tão longos quanto os meus, grisalho, óculos amarelos e verbalizando os maiores impropérios pra algum colega.
Era ele, LUPEU LACERDA, autor de Entre o alho e Sal. Quem me conhece sabe da minha verdadeira devoção a esse cara, ao que ele faz, ao que escreve, Lupeu é mágico, Lupeu é um et, um dia teremos intimidade suficiente para ele me admitir isto. Eu amo Lupeu, amo de encher o peito, a boca e a alma. Eu estava tão orgulhosa por ele ontem. Eu transpirava felicidade, queria que o mundo pudesse escutar Lupeu. Ele me recebe assim, doce, doce, com um abraço longo, saudoso e logo diz: - Vem que eu vou te levar ao Gustavo.
Daí enfim, abraço tímido no crítico-escritor-chef-cozinheiro-doce-Gustavo, autor de O amor é uma coisa feia, que apesar dos fios brancos denunciarem, Gustavo ainda traz a voz suave e o olhar de menino. Me autografou carinhosamente o seu livro. Aline chega, finalmente, uma amiga-espelho, só que os farois dela são muito mais reluzentes que os meus, mas calma, não se empolguem, não falo dos seios dela aqui, não ainda. É dos olhos de lince daquela moça. Logo arrumou escritores-fãs por todos os lados, virou musa de algum dos escritores que a fotografava a cada passo que dava. Tímida-tímida, me chama pra coadjuvar a fotografia dela. Daí encontro meu amigo blogueiro da risada mais gostosa do mundo, Cesinha com umas madeixas quase iguais as de Lupeu e num papo sobre literatura (claro) Falamos sobre Caio F. Abreu, de imediato Lima Trindade se revela a mim também um fã de Caio, e assim conheço o Lima, fígura interessantíssima que disse: -Você precisa ler meu livro. Em seguida e finalmente conheço o outro escritor, acho que tão jovem quanto o espírito de todos os outros, mas certamente ou ao menos aparentemente mais ajuizado que Lupeu e Gustavo juntos, o Sandro Ornelas, autor de Trabalhos do corpo. Sandro é calado, parece que tímido ou pelo menos foi o que ele aparentou ser lá do outro lado de uma mesa enorme cheia de livros, bêbados e bebidas. Assim como o Lima, Sandro me autografou um livro.

Passamos a noite conversando e eu transbordava de felicidade, feliz por mim, pelos meninos, pelo encontro, parece que os loucos se reconhecem dentro da sua normalidade. Como uma irmandade secreta, eles vinham e sentavam, puxavam um assunto sempre polêmico-interessante-engraçado-culto-sem frescura.

Resumo da ópera é que dormi com os quatro. Todos na minha cama. Os livros, claro.
E hoje tem mais, moqueca de não-sei-o-que-ainda preparada pelo chef-que-não-gosta-de-ser-chamado-de-chef na casa do Lupeu, com a mesma turma, acho que a mesma cerveja deles, porque hoje acabei de jurar aos meus orixás que não bebo nunca mais!
Melhor que youtube, melhor que sexo, só a noite que tive ontem com esses caras.

segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

Sobre os sonhos.


Ela não podia insinuar, nem pedir abraço, não podia tocar, muito menos reclamar. Ele não diria que estava ferido, até fingia que quase não doía, e ela fingia que quase não machucava. Não se diziam nada, fechavam os olhos e deitavam um sobre o outro e ouviam o barulho do vento, fingiam dormir para enfim sonharem.
E sonharam o mesmo sonho. Não tinha hematomas, sufoco, dor, aperto no peito, nem coração exposto, estava tudo bem, enfim, outra vez.

domingo, 6 de janeiro de 2008

Sobre a coisa.


Agora olho em volta e não tenho certeza se gostaria mesmo de estar aqui. Só sei que dentro de mim tem uma coisa pronta, esperando acontecer.

O problema é que essa coisa talvez dependa de uma outra pessoa pra acontecer.


- Toque nela com cuidado. Senão ela foge.

- A coisa ou a pessoa?

- As duas.


Você consegue me entender?

sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

Sobre o nada.


A gente se prometeu, lembra?
Como todos os anos, prometemos que tudo iria ficar bem. Quando viesse chuva miudinha, você me ligaria e o medo de trovão passava. Quando você precisasse de um disco triste para as suas noites, eu te daria todas as melo[dias].
Você com aquela mania de desenhar o mundo com os dedos, lápis imaginário, você prometeu me desenhar alí, mentir um bocado nas minhas formas e me dar uns pedaços de gargalhadas.

A gente se prometeu, lembra?
Tudo, absolutamente tudo seria lindo. Não porque a gente ia fazer ficar bonito, mas porque era, mesmo não sendo. E nos acomodamos no juramento dessa certeza.
Eu era aquela menina que amava só porque achava bonito amar, e você dizia que o amor era uma coisa feia. Você me prometeu amar, eu aprendi a desiludir.
E ia dar tudo tão certo.
Não tinha como errarmos.
Mas você, agora com esses olhos cinza. Castanho-real era tão mais bonito.
O que foi que esquecemos? Onde escondemos o nosso trato?

A gente tinha se prometido, sabe?
E hoje, ter que amanhecer assim, todos os dias te vendo costurar os pulsos, me corta a alma.


E eu que nem tenho mangas compridas que escondam essas tuas/minhas cicatrizes...